terça-feira, 24 de maio de 2011

ÉTICA



Estive de sexta-feira a domingo no Meeting Brasil, promovido pela Consulting House de quem sou parceiro, no Hotel Jequitimar, Guarujá-SP.  O evento contemplou duas palestras magnas, uma no início e outra no encerramento, e painéis dos quais participaram cerca de duzentos e cinqüenta executivos presidentes, diretores e dirigentes de empresas de grande porte de diferentes setores da economia. Os temas nos painéis foram estruturados em Governança e Gestão, Finanças, Recursos Humanos, Suply Chain, Vendas e Jurídico. Mediei os painéis de Governança e Gestão e de Suply Chain.

No painel de Governança e Gestão foram apontadas três questões centrais: a quem compete o desenvolvimento de líderes (a academia, a consultorias ou a própria organização através de universidades corporativas)? A alegação de vários presidentes é de que há um grande distanciamento tanto da academia quanto da consultoria do mundo real das organizações. E na medida em que cada organização deve buscar sua identidade, cabe a ela promover o desenvolvimento de seus líderes. (Eu disse, o evento contemplou organizações de porte). Outra questão levantada é de como exercer Controle, aqui no sentido amplo e uma das atribuições da governança, num ambiente absolutamente aberto em que podemos considerar a realidade como caórdica, um misto permanente de caos e ordem, ordem e caos. Uma terceira e última questão foi apontada a relação de poder entre os acionistas e/ou seus representantes legais, via Conselhos, Comitês, etc., e os diretores executivos da organização. Nessa questão foi muito comentada a manchete dos jornais americanos quando da crise de 2008: onde estavam os Conselhos?

No painel de Suply Chain, participaram os executivos de três organizações: uma do setor automobilístico, uma do setor de alimentação e a terceira do setor de higiene, cosméticos. As três faturam juntas, por ano, perto de R$35 bilhões e importam e exportam entre 4.000 e 6000 itens cada. Suply Chain é a gestão da cadeia de fornecimento. A competição global não acontece entre empresas, mas entre cadeias de fornecimento. A gestão da logística e do fluxo de informações em toda a cadeia permite aos executivos avaliar pontos fortes e pontos fracos na sua cadeia de fornecimento, auxiliando a tomada de decisões que resultam na otimização de recursos alocados, aumento da qualidade, gerando competitividade ou criando valor e diferenciais em relação à concorrência. Como resultado do painel, mais uma vez pela expressão dos que dele participaram, foi constituído um grupo para articular as diferentes iniciativas, associações e congêneres que se ocupam da estratégia envolvendo o Suply Chain para um melhor equacionamento a nível Brasil das questões relacionadas à infra-estrutura (portos, aeroportos, ferrovias e estradas); aos marcos regulatórios e a sistemas de TI disponíveis do mercado global. Apenas como destaque: um dos participantes, Vice-Presidente de Suply Chain de uma companhia vinícola chilena, discorreu sobre quão é difícil operar no Brasil, queixando do processo que envolve a colocação manual em todas as garrafas de um selinho da fiscalização, um por um (lembro que são milhões de garrafas importadas e exportadas por ano). Ao que o VP da empresa de alimentação rebateu: mato oito milhões de frango por dia e exporto para o mundo muçulmano. Um dos participantes disse que para ser Suply Chain em organizações do porte como a deles somente dentro de duas categorias: sendo louco ou portador de uma inabalável fé. Bacanas, os caras.

Para mim as duas palestras magnas foram o ponto alto do nosso encontro. A primeira de Mário Sérgio Cortela, educador e filósofo da USP. Duas questões de fundo permearam a sua fala conclamando a todos para uma reflexão: o que posso fazer para não ter uma vida fútil, superficial, banal e indecente? E a outra: sei que é legítimo, mas me convém? Para exemplificar essa questão lembrou o jogador da seleção de futebol da França, que marcou o gol de classificação do seu time para a Copa do Mundo de 2008. O gol foi considerado legal pelo árbitro da partida, mas valeu? A França foi humilhada no torneio e coube até processos envolvendo os que participaram da delegação. Nem tudo que é legítimo me convém.

O encerramento coube a Clovis de Barros Filho, também filósofo, da USP e que vem sendo disputado pelo mundo corporativo para dar palestras, também sobre ética. Brilhante o Clóvis. Clóvis nos trouxe a questão: BEM ESTAR ou ESTAR BEM? QUALIDADE DE VIDA ou VIDA DE QUALIDADE?  Para tratar do tema disse que a botânica sabe hoje mais sobre samambaias do que há 30 anos, mas sobre a vida sabemos o mesmo que em 400 a. C. Trouxe o amor e o classificou em três grandes pensadores: o primeiro Platão, para quem o amor é EROS, o desejo do que me falta. Amo o que não tenho, o que tenho a conquistar. O segundo Aristóteles, o amor é FILIA, a alegria. Amo o que me traz alegria. Nos dois primeiros o sujeito é aquele que ama e que nestes dois tipos de amor há convergência, complementação. Amo o que desejo e o que me dá alegria. Há, ainda, um terceiro tipo de amor, ÁGAPE: o que foi pensado e praticado por Jesus Cristo. Sem revestir o personagem da questão religiosa, o pensador nos trouxe o amor ao outro, e aqui o sujeito não é aquele que ama, mas aquele que é amado. 

Mais do que uma jogo de palavras Clóvis nos convida a refletir sobre o que desejamos, o que nos traz alegria e quanto consideramos o outro, pois poderá estar ai o nosso estar bem e nossa vida de qualidade.

Embora a filosofia seja considerada um bem inútil tanto Cortela quanto Clóvis têm dado uma inestimável contribuição ao ambiente de negócios. Vale à pena pensar.


Até breve.

2 comentários:

  1. Tenho dificuldade ainda de entender como ser um profissional apto para grandes organizações, pois entendo que ter "Ética" corporativa é ser um pouco louco com uma fé inabalável com uma busca incessante de um imaginário bem estar e vida de qualidade.
    Tenho me abidicado desta "etica" nos ultimos dias.

    ResponderExcluir
  2. Agulhô enquanto você trascende nesse blog, eu Aristotelicamente o abro e de forma platônica estou aprendendo muito com seus textos.

    ResponderExcluir