quinta-feira, 30 de setembro de 2021

REMÉDIOS

 

(Foto tirada por mim em Sambaqui, Floripa)


“A literatura concorre para uma sociedade mais harmoniosa, porque pelo texto literário você percebe que o mundo vai além de você. Você aprende com o texto literário a democratizar a razão.” (Bartolomeu Campos de Queiroz)

 

Sou grato à Vida por ter me distinguido por inúmeros privilégios.

Entre tantos, o da infinita ignorância é aquele que mais agradeço. Reconhecê-lo ao longo de todo o meu percurso obriga-me a ampliá-lo a cada dia.

Li muito e pretendo continuar lendo. A cada livro alargo o meu privilégio. Incrível como ao término de cada leitura, sinto-me mais raso o que me estimula a buscar mais e mais saber para não saber tudo. E ainda, assim, buscar saber.

Outro privilégio, tão relevante como o citado, ser vitimado por acasos, no que tange à minha infinita ignorância. Livros me chegam, como que se soubessem da minha necessidade em lê-los. Poderia citar inúmeros episódios sem que nem porque fui instado por parentes, amigos, outras leituras e não necessariamente correlatas.

A infinita ignorância é como sexo. O orgasmo é um desmancha prazer. Logo, você o quererá de novo, e de novo e de novo, e por mais que você procure, o sabor e o prazer advindo da infinita ignorância são inenarráveis, não decifráveis, não sabidos.

Só que uma delícia vertiginosa, a infinita ignorância.

Talvez derive daí outro privilégio: o humor. Até meus netos não fiam em mim, quase sempre produzo pilhérias de um tudo. Fosse a um analista, colocaria no divã a minha avó materna como culpada. Diante de conflitos domésticos acalorados ela sempre saía com: “Não sei porque brigam tanto se pra lá nós vamos.”.

Desde sempre, portanto, o humor serviu-me como um bálsamo. Sobretudo na infância, dada à penúria familiar e a dura vida de minha mãe. Eu gostava de imitar os humoristas da TV e do cinema. Ronald Golias, Ivon Curi, Cantinflas, Mazzaropi. Ela ria, ria, ria tanto que por diversas vezes saiu correndo urinando pelas pernas abaixo, de tanto rir. Fazê-la rir foi sempre, em casa, o melhor remédio.

De quem rio mais é de mim mesmo, inclusive agora, por este texto. A minha tolice em acreditar que se aceitássemos todos a nossa infinita ignorância e ampliássemos o nosso senso de humor, talvez faríamos um sexo coletivo transbordante.

E a Vida teria mais sabor. 


Até breve.


segunda-feira, 20 de setembro de 2021

AGUAR

 




Outro dia escrevi aqui que havia amanhecido vivo e que isto vinha acontecendo há vários anos.

E continua.

Hoje tomei uma decisão: vou suicidar, vou me suicidar, vou suicidar-me, vou-me suicidar. Seja a construção sintática que for, se sintática, o fato é que a decisão está tomada.

Não amanhecerei vivo.

Espera, amigo, embora a decisão esteja tomada, falta escolher o motivo e o quando, e aqui reside o grande obstáculo para que eu não realize o feito, amanhã, pelo menos. Assim, não há razão para que você se alarme, ligue pra mim, mande alguém ligar, enfim tente dissuadir-me, pelo que, de pronto, agradeço.

O quando depende do motivo, portanto, a grande dificuldade está na escolha, porque não são poucos para que eu dê cabo de minha vidinha.

Estou convalescendo, com imensa angústia, de uma perda afetiva. Por si só seria uma razão mais do que justificável.

Há outras, ainda que secundárias.

A dor pela constatação do que ambientalistas vem nos sinalizando há décadas: a mudança climática, fruto de nossas mais do que criminosas e aberrantes ganâncias. Toda vez que chego na sacada do meu quarto deparo-me com a agonia das árvores da mata defronte.

A dificuldade absurda recentemente adquirida de me relacionar socialmente, especialmente quando em grupo cujo tema é o quadro político. Quando estou com “nós”, não me sinto parte e não compreendo o que “nós” quer dizer de “eles”. Quando estou com aqueles que suponho ser “eles” daquele “nós”, o mesmo ocorre. Não há lugar para “Eu”. Ou Eu tenho quer ser de um nós ou tenho que ser de um eles.

Meu pai padeceu anos do Mal de Alzheimer. Não é essa terrível doença que temo contrair, mas do Mal do Ódio. Por absoluta ingenuidade, ou incompetência adquirida, não consigo atualizar-me para esta prática. Estou analfabeto social.

Todos os meus acolhimentos de comentários no FB são com: AMEI.

Outras questões, menos relevantes, me afligem, como a devastação da cultura, a mediocrização dos diálogos, o oco do vazio.

Talvez porque seja segunda-feira.

Lembrei-me de meu caseiro já falecido: seu Divino. Eu vinha para o sítio somente nos finais de semana e reclamava com ele que as plantas estavam muito sofridas.

Ele, honrando seu nome, sempre dizia:

- Ô, Gulhô, cê vai vê nas água... Elas renasce tudo travez, sô!


Até breve.


sábado, 18 de setembro de 2021

FUTURAR

 


Liz, Tin, Totô e Lelê, brincando outro dia juntos, dialogavam.

Aí, de repente, tiveram uma ideia:

- Vamos montar duplas?

- Como assim?

- É, vamos caçar nomes que possam brincar conosco?

- Ainda não entendi...

- Puxa, é muito fácil, é assim: a gente tem que escolher, dois nomes...

- Dupla é de dois nomes, né ô!

- Pois é, dois nomes. O primeiro para Presidente e o segundo para Vice.

- Mas isso é brincadeira de adulto, não quero, é muito chata. Num tem graça! Num quero brincar disso.

- Que que a gente ganha no final da brincadeira?

- Um futuro.

- Vamos brincar de outra coisa...

- Vem cá sô, é rapidinho. Prometo que vai ser divertido.

- No futuro eu vou ser jogador de futebol...

- Quem não sabe, você só tem bola na cabeça.

- Eu vou ser bailarina, contadora de histórias... Ah, eu não sei ainda.

- Eu, pilota de avião, já falei.

- Todo mundo riu porque eu falei que vou ser pensador...

- A gente podia chamar o vovô pra ajudar, né?

- Neim!!! Ele vai atrapalhar...

- Ele é muito doidinho, vai querer uns nomes que ninguém nem nunca ouviu falar...

- É capaz até dele inventar uns nomes para avacalhar a brincadeira.

- Num fala assim dele, não.

- E num é?

- Pior que é...

- Mas a gente podia chamar os amigos dele do blog...

- A gente nem sabe quem são...

- Vovô também num sabe de muitos também não...

- Vamo logo começar com isso que eu quero ir jogar bola...

- Então tá, quem começa?

- Fernando Haddad e Luiza Trajano.

- Rogério Pacheco e Simone Tebet.

- Fernando Bezerra e Marco Rogério.

- Ciro Gomes e Eduardo Leite.

- Romeu Zema e Tarcisio Gomes de Freitas

- Alexandre Vieira e Fabiano Contarato.

- Jorge Doria e Luciano Hulk.

- Jorge Amoedo e Horácio Piva.

- Henrique Mandetta e Eduardo Leite.

- Tasso Jereissati e Geraldo Alckmim.

- Tá difícil...

- Tenta.

- Cês num esqueceram de dois nomes não, hein?

- Esses dois aí que você pensou eu num quero nem lembrar...

- Se os amigos do vovô quiser, que que a gente pode fazer né?

- Ah, chama logo os amigos do vovô, vai...

- Eles que são responsáveis pelo futuro, né?

- Pior que é...

- Mas eles têm um ano para entrar na brincadeira, né?

- É, mas tem que avisar o vovô pra ele falar com os amigos dele que não é pra escolher já agora os nomes que querem que ganhe não. É só o que eles gostariam que estivessem no debate para poder ajudar na escolha, né?


Até breve.

OBS.: Para entrar na brincadeira é só apontar as duplas nos campo: COMENTÁRIO


quarta-feira, 8 de setembro de 2021

APELO

 

A mim não parece saudável, enquanto conduta democrática, a desconsideração do número expressivo de pessoas que responderam, no dia de hoje, ao chamamento do presidente da república.
Por mais absurdas e inadimissíveis que são as atitudes do sombrio e insano presidente, devemos acolher as queixas de nossos concidadãos que o acompanham e, com argumentos, em quaisquer esferas, buscar dissuadí-los em insistirem na defesa de sandices, para não dizer criminosas intenções.
O Brasil já tem problemas de sobra para equacionar. Não podemos dar margem a que conflitos sociais, de consequências inimagináveis, tornem nossas mazelas ainda mais insustentáveis.
Convém que, enquanto pessoas esclarecidas, saibamos conter as nossas paixões mais do que exacerbadas e buscar convergências.
É passada a hora de rompermos com que nos separa.
Viver em paz é infinitamente melhor.


Até breve.

terça-feira, 7 de setembro de 2021

DEZOITO

 


Noticiou-se, ontem, a décima-oitava vitória processual do ex-presidente. Mantida a inquestionável competência de seus advogados para encontrarem, nas entrelinhas e entrementes, oportunidades para protelarem os processos mantendo-os distantes do juízo de mérito.

Na sequência, a comunicação formal dará conta de que pela décima-oitava vez a justiça não encontrou provas e que o ex-presidente, a cada processo, demonstra a sua inocência.

No mérito perde-se de vista o desaparecimento do mercado das cinco maiores empreiteiras responsáveis por contratos de infraestrutura que, à época, faturavam juntas algo perto de mais de R$100bi. Também, tampona-se a decadência do empresário X, umbilicalmente ligado ao casino palaciano, que detinha a 8ª fortuna do mundo e hoje mantém em seu patrimônio apenas a sua mansão (herança familiar intocável) à beira do Cristo Redentor. Condenado a 30 anos de cadeia, continua livre prestando consultoria em projetos de investimentos no Brasil.

Da mesma forma, apenas para citar uma ou outra evidência da lama, a escorchante ação predatória do erário através de práticas de evasão fiscal que, como bomba de efeito retardado, culminaram em pedaladas que mandaram para a rua a pobre senhora presidenta. Golpe patrocinado pela Lei de Responsabilidade Fiscal.

Em futuro próximo, é de todo provável, que estaremos assistindo algo que se assemelhará. O atual presidente manter-se-á ileso dos crimes pelos quais será indiciado de forma inPrecisa. No mérito, se tamponará que ao longo de seu especialíssimo desgoverno, ocorreu uma pandemia que vitimou centenas de milhares de pessoas e que, ele não foi responsável nem direta e nem indiretamente pelo ocorrido. Entre outros crimes hediondos levados pela boiada.

É que é madrugada e eu, como de outras vezes, acordei de um sonho.

Sonhava que o povo que vai para a praça hoje, num lapso de extraordinária e improvável tomada de consciência, unia as cores de suas bandeiras e bradava por causa única: ELES NÃO!

Este post foi publicado no FB e, lá, se autodestruirá em doze/dezoito horas e eu retornarei à página com outros textos que, como quer meu mestre, o psicanalista Chico Daudt, continuarei fazendo parte da graça, da cura e do (escasso) sabor do Facebook. 

Folia por folia, continuo com a minha.


Até breve.


quinta-feira, 2 de setembro de 2021

PRIMAVERA

“Eu gostaria de pacificar o conceito de força como aquilo capaz de produzir e suportar elos”. (Juliana Monteiro) 


Assisti com especial interesse e atenção à conferência de JARED DIAMOND, biólogo americano evolucionário, fisiologista, biogeógrafo e autor de não-ficção. É mais conhecido no Brasil pelo seu livro Armas, Germes e Aço. Em 1997 foi vencedor do Prêmio Pulitzer.

A oportunidade faz parte do ciclo de cinco conferências de proeminentes pensadores da atualidade em diferentes campos do conhecimento realizada pela plataforma Fronteiras do Pensamento que ocorrerão a cada mês até dezembro de 2021.

Basicamente Diamond coloca a pandemia como uma experiência relevante para a Humanidade porque, na opinião dele, foi o primeiro acontecimento em escala verdadeiramente global que afetou, e ainda afeta, a todos os habitantes do planeta.

Ele vê a COVID19 como um alerta expressivo para as lideranças de todo o mundo no enfrentamento do que considera os três maiores desafios do contemporâneo: as mudanças climáticas, o insustentável uso de materiais e a desigualdade econômico-social.

Estes três desafios conjugados e interligados, um determinando o outro ou amplificando os seus efeitos, estão seguramente muito para além das agendas que ocupam as lideranças internacionais, aumentando ainda mais os efeitos decorrentes.

É cada dia mais patente a extensão dos desastres ecológicos: o verão europeu com a marca recorde de 50ºC na Itália; enchentes, queimadas, terremotos. Na noite de ontem, a cidade de Nova Iorque foi assolada com a chuva mais intensa dos últimos 156 anos.

Tenho ocupado os meus amigos com singelos poemetos ilustrados com fotografias de minha morada. Assim como historinhas e episódios que têm meus netinhos como protagonistas.

Quem visita minhas páginas comenta que vivo num paraíso, compartilhando-o com uma família maravilhosa.

Sim, a Vida tem sido muito generosa para comigo e pelo que agradeço todos os dias.

Às vezes penso que minhas postagens devem soar, para alguns, como ostentação barata, fuga ou alienação dos graves problemas que nos assolam.

Às vezes penso que deveria engrossar a fileira daqueles que, em redes sociais, militam com suas ideias na esfera política procurando dar sua contribuição aos debates ou apontando denúncias dos fatos avassaladores do cotidiano.

Tenho dúvidas dos efeitos práticos desta ação. Penso que, de alguma forma, algumas inserções com milhares de adeptos contribuem de forma expressiva no agravamento das nossas mazelas.

Perdoem-me o textão. Eu poderia simplesmente postar a letra da canção Sol de Primavera do Beto Guedes. Não deixem de assisti-lo no YouTube. Musicada, ela fica mais intensa.

 

Quando entrar setembro

E a boa nova andar nos campos

Quero ver brotar o perdão

Onde a gente plantou juntos outra vez

Já sonhamos juntos

Semeando as canções no vento

Quero ver crescer nossa voz

No que falta sonhar

Já choramos muito

Muitos se perderam no caminho

Mesmo assim, não custa inventar

Uma nova canção que venha nos trazer

Sol de primavera

Abre as janelas do meu peito

A lição sabemos de cor

Só nos resta aprender

 

Pois é.




Até breve.