domingo, 31 de maio de 2015

PÚSTULA



No final do ano passado a família estava conversando, quando o pai prenunciou: “Um de nós aqui perderá o emprego no próximo ano”.

Hoje a família conta com três desempregados, dois de companhias transnacionais onde trabalhavam há mais de quinze anos.

Encontrei-me esta semana com Pretinha conversando com uma jovem senhora, muito próxima de nós. A jovem estava às lágrimas e eu procurei saber por quê. O marido não trabalhará mais as sextas-feiras e terá uma redução de 13,5% do salário para que seja possível a manutenção de seu emprego.

- Reduziu muito o número de seus clientes, disse ao dono do restaurante que fica em frente ao prédio onde moro.

- Muitas empresas fecharam aqui ao redor...

A crise contemporânea ultrapassa as capacidades dos estados nacionais em debelá-la. Para além das variáveis parametrizadas por especialistas e teóricos, a questão não se restringe à ciência econômica e muito menos à ciência política.

A vulnerabilidade dos aparelhos da democracia – modelo desejado pela maioria dos cidadãos daqui de do mundo a fora – se expande de maneira explosiva.

A História não havia registrado ainda o mosaico de complexidades apresentadas no tempo presente. Não se trata de um ciclo já experimentado. Há ineditismo no quadro.

A migração da riqueza das nações para conglomerados privados retira de forma contundente e preocupante a possibilidade de governos gerirem a expansão de suas necessidades. O coletivo perde terreno na esfera do Poder para os interesses privados.

É profunda a diferença das oportunidades dos cidadãos. Três trilhões de dólares ao ano, que corresponde ao PIB da Alemanha (4ª economia do mundo) são consumidos em produtos de luxo por uma minoria que comanda o novo império.

A produção rentista de capital sobre capital aliada aos inúmeros desvios muitas das vezes patrocinados, fomentados e/ou acobertados por grandes instituições financeiras globais encontram dimensões vultosas e inimagináveis.

A recente intervenção da Policia Federal Americana explicita que o crime tem dimensão planetária e que sim, passou a ser uns dos maiores riscos para a sustentabilidade do planeta.

Não me parece que a questão está focada em meia-dúzia de 10 ou 15 bagres, entre eles o Marin que, coitado, tem uma casinha de vinte milhões de reais. O alvo é outro.

A sonegação sistemática e endêmica, a corrupção institucional e viral, o vampirismo da política fundada em interesses de indivíduos, a descrença da sociedade na possibilidade de que algo efetivamente aconteça, além do desconhecimento das verdadeiras realidades emolduram, a meu ver, um quadro alarmante.

Na minha juventude pueril eu acreditava que o inimigo da vida digna era o governo que se instalara pela força. Em dezembro de 1968 eu tinha dezesseis anos e fiquei literalmente puto com a promulgação do Ato Institucional nº 5. Em 1970 meu irmão foi expulso do Exército por ter pensamentos diferentes dos estabelecidos pelo regime.

Na minha juventude pueril nós tínhamos um inimigo tangível e perceptível com o qual podíamos nos debater.

Hoje, não.

Mais grave, mortífero e aterrador que o próprio Exército Islâmico e que todos os demais grupos terroristas em atuação mundo a fora, a riqueza que não reparte é a nossa maior temeridade.

Seu endereço é a infovia, instituições financeiras blindadas por aparatos legais internacionais, fundo falso de automóveis, jatos, jatinhos e jatões, iates, navios, alfândegas compradas, meios logísticos pelos quais gravitam somas inimagináveis de moedas em espécie.

Paraísos fiscais que implicam na ciranda perversa e determinam a coerência mais do que perversa de que se façam necessários ajustes fiscais.

A democracia agoniza.



Até breve.

quarta-feira, 27 de maio de 2015

BULE



Enquanto isto...


1.      “O ex-presidente da CBF e da organização da Copa do Mundo de 2014, José Maria Marin, está entre os detidos hoje em Zurique e acusados pela Justiça americana de ter recebido propinas milionárias em esquemas de corrupção no futebol. 
No total, sete dirigentes da Fifa foram presos hoje, todos eles latino-americanos e sempre à pedido do FBI. A Justiça americana confirmou a prisão do brasileiro e indicou que parte das propinas se referiam à organização da Copa do Brasil, Taça Libertadores da América e mesmo da Copa América. Além de corrupção, Marin é acusado de “conspiração” e pode ser extraditado aos EUA.
Com reservas de US$ 1,5 bilhão e tendo lucrado mais de US$ 5 bilhões com a Copa do Mundo no Brasil em 2014, a Fifa parecia ser até pouco tempo uma potencia paralela, blindada da Justiça. A operação, liderada por cerca de uma dúzia de policiais, se transforma no maior escândalo já vivido pela entidade mergulhada em crises e casos de corrupção.”

2.      “Mesmo sem convencer dissidentes petistas, o governo conseguiu aprovar na noite desta terça-feira, 26, no Senado, por 39 votos a 32, o texto-base da Medida Provisória 665, que restringe o acesso a direitos trabalhistas como o seguro-desemprego, o abono salarial e o seguro-defeso.”

 Do outro lado...

3.   “O sumiço de US$ 1 bilhão de bancos tem tirado o sono dos moradores da Moldávia, pequena nação europeia, espremida entre a Romênia e a Ucrânia, que estaria sobre o risco de quebrar.
De acordo com a rede britânica BBC, informações vazadas pelo Banco Central e por uma consultoria revelaram um buraco de US$ 1 bilhão – equivalente a 12% do Produto Interno Bruto (PIB) do país – em três das maiores instituições financeiras da Moldávia, o que muitos no país estariam chamando de ‘o roubo do século’.”

Sou correntista da Caixa Econômica Federal e opero na mesma agência bancária há mais de vinte e cinco anos. Realizo todas as minhas operações, pessoas Física e Jurídica, via internet.
Há três dias estou tentando adicionar Módulo de Segurança. Tudo bem que eu seja néscio no assunto, mas aqui entre nós, não poderia ter algo mais simples já que os bancos nos fizeram – clientes -, a trabalhar para eles?
Se bem que, depois que li hoje no Estadão as matérias acima, entendi.
É mesmo necessário atualizar os módulos de segurança.
Eu, pó comum, ofereço um perigo enorme.

Até breve.

LEIA TAMBÉM: DOMINÂNCIA      ASSISTA TAMBÉM: IMPOSTO

terça-feira, 26 de maio de 2015

INSÂNIAEDADE



Há uma resposta que não quer calar.

A questão, entretanto, está na pergunta. Qual pergunta fazer para se ter a resposta desejada que estivesse pronta, aguardando?

Essa coisa da vida estar adiante sempre foi algo que não deveria. Morrer primeiro ficava muito mais simples, ou não? Primeiro você sabe, depois vai vivendo apenas para dar conta do período.

Até tornasse esperma ou óvulo, ciclando ao contrário. Como se tudo fosse um grande útero.

Já que não é como deveria, fazer o quê?

Outro dia ouvi uma pessoa dizer que, provavelmente, tudo acabará. Assim.

O problema é quê, enquanto isto, é.

Olha que pode até de ser. A gente cumpre um período e volta pra origem uterina. Só há bolsa, tudo é placêntico que de repente explode.

Na minha casa tem um bule e eu detesto café. Nunca tomo. Deveria ser de assim, com a vida. Prá que se não é nem necessária.

Depois, se pensar bem, café pode num ter em bule. É ou não é? Em garrafa térmica, por exemplo. Eu tô falando de outras formas de contenimento, outros conteres, até entendimentos.

A vida pode estar fora disso tudo. Por que não pode? O café não necessariamente precisa estar em bule.

A vida pode estar em garrafa térmica.

Ou em pó. Do começo ao fim. “Do pó viestes e ao pó retornarás.”

Por isso que eu fico imaginando. Eu detesto a vida tanto quanto café. Prá que ter um bule em minha casa?

Se eu jogar o bule fora, eu perco a vontade de não tomar café?

Interessante, o pó em não tenho em minha casa. Nunca tomo café. Pra quê então?

Pra quê então, o quê?

A vida?

Outro dia eu estava em casa e alguém me pediu um copo d´água. Eu servi no bule. A visita estranhou e me perguntou por que.

Eu disse que não tinha café. A pessoa disse que tinha pedido só água. Eu fiquei meio sem saber para que serve o bule.

É mais ou menos como a vida.

Em pó.



Até breve

sexta-feira, 22 de maio de 2015

PAUTA



Amanhã compareço a um almoço comemorativo ao aniversário de setenta anos de um grande amigo nosso. Quando fui redigir o cartão, que acompanhará um singelo presente, refleti que há setenta anos o mundo vivia o estertor de uma das maiores tragédias da humanidade.

A Segunda Guerra Mundial que ceifou mais de 73 milhões de vidas humanas entre combatentes e civis e que durou de 1 de setembro de 1939 a 2 de setembro de 1945.

O que pensavam os pais desse nosso amigo, que nasceu em maio, portanto pouco mais de três meses antes de terminar o horrendo conflito?

Recebi de uma ONG internacional uma solicitação de apoio, inclusive financeiro, para solidarizar-me com algo de proporções menores, mas tão hediondo quanto, que está acontecendo agora sob os nossos olhos e ouvidos.

“Os povos mais perseguidos de nosso planeta estão embarcando em verdadeiros "navios da morte" para fugir da violência e encontrar um lugar seguro para suas famílias. Em vez de responder com humanidade, porém, nossos governos estão fechando as fronteiras, deixando que essa gente morra de fome e se afogue no mar.

O Mediterrâneo e o mar de Andamão estão se tornando cemitérios.

Mianmar está expulsando o povo da etnia Rohingya e, com isso, milhares de famílias estão à deriva no mar, impotentes, forçadas a beber sua própria urina porque haviam sido rejeitadas pela Malásia, Tailândia e Indonésia. Todas as semanas, cidadãos sírios e africanos também correm o perigo de morrer afogados na costa sul da Europa ao arriscar a travessia assustadora, tida como a última esperança de escapar de tortura, fome e traficantes.

Estamos enfrentando a maior crise de refugiados desde a Segunda Guerra Mundial, mas até agora os governos estão permitindo que pessoas morram em meio a um clima crescente de xenofobia.

O governo britânico permitiu que apenas 143 cidadãos sírios dentre 4 milhões de refugiados entrassem no país!

Trinta mil refugiados poderão morrer afogados apenas no Mediterrâneo neste ano. Estas famílias, que estão fugindo do terror e da miséria, têm como única opção escolher embarcar nestes barcos perigosos.”

Este é parte do texto que recebi da ONG.

Até hoje não consegui elaborar bem o filme de Win Wenders, O Sal da Terra, razão pela qual lavrei AGONIA, GADGET, ZSCHE e PERCEPTOR. Em extensão reli Deleuze, trechos de Spinoza, que só exacerbaram meu incômodo. Tentei sair pela tangente em Zsche, pura tolice.

Hoje pajeei Noninha e Tim, para que Pretinha fosse trabalhar. Amanhã, pela manhã quero muito estar com Antônio. Não consigo olhar para eles e não pensar em que mundo estarão vivendo daqui alguns anos.

Quanto à posts eu poderia escolher outros temas, contudo.

Postar, por exemplo, a respeito da onda que vem da Europa do crescente hábito do mundo masculino de urinar sentado ou, com peso de importância semelhante, o corte de R$70 bilhões do orçamento da União.

Opto pela amargura.




Até breve.

quarta-feira, 20 de maio de 2015

PERCEPTOR



“Tudo o que eu preciso saber é que o homem é um ser humano. Isto é suficiente para mim, pois ele não pode ser nada pior!”. Mark Twain


Penso, contudo, que se faz importante recuperar a alegria, a leveza, a tranquilidade e a inefável certeza de tudo estar bem mesmo quando está tudo equivocado.


“A alegria é tudo o que consiste em preencher uma potência. A tristeza é quando estou separado de uma potência da qual eu me achava capaz, estando certo ou errado.

Qualquer tristeza resulta de um poder sobre mim. O ruim é o menor grau da potência. E o ruim é o Poder. O que é maldade? É impedir alguém de fazer o que ele pode, impedir que este alguém efetue a sua própria potência.

Portanto, não há potência ruim, há poderes maus. E, talvez, todo poder seja mau por natureza.
A confusão entre potência e poder é arrasadora, porque o poder separa sempre as pessoas, que estão a ele submissas, do que elas podem fazer.” (Gilles Deleuze)

“Evitemos as paixões tristes e vamos ao encontro da alegria para ter o máximo de nossa potência; fugir da resignação, a má consciência, a culpa, e todos os afetos tristes que padres e juízes exploram.” (Spinoza)


Meu colega de ontem estimulou-me a voltar a post.


“Nietzsche inventou a ideia de que os homens estão num estado de dívida infinita. Antes havia histórias de dívidas finitas, mas Nietzsche precedeu todos os etnólogos. Nas sociedades primitivas havia permuta de dívidas. Não funcionava tanto através da troca, como se pensava, mas por partes de dívidas: uma tribo tinha uma dívida para com outra tribo, etc. Eram blocos de dívidas finitas: eles recebiam e devolviam. A diferença com a troca é que havia a realidade do tempo. Mas quando as dívidas têm esse aspecto finito o homem pode se libertar.” (Gilles Deleuze)


Penso que um homem de letras é aquele que pode construir conjuntos de percepções e sensações que vão além de quem as sente. Ele tenta dar ao complexo de sensações uma independência radical em relação àquele que as sentiu.


“Ao revermos a história das obras de Van Gogh e Gauguin, observamos que para eles a abordagem da cor se fazia com tremores. Eles tinham medo! A cada começo de uma obra deles, usavam cores mortas. Cores de terra, sem nenhum brilho. Por quê? Porque tinham o gosto e não ousavam abordar a cor. O que há de mais comovente do que isto? Na verdade, eles ainda não consideravam dignos, não se consideravam capazes de abordar a cor, ou seja, de fazer pintura de fato.” (Gilles Deleuze)


Escrevo com medo.




Até breve.

terça-feira, 19 de maio de 2015

ZSCHE



Posts como os anteriores é porre e dos bravos.

Já disse ao nosso editor que o blog perde com nossos colegas metidos à cabeça, produtores de questões que a ninguém interessa, deveriam servir café na redação e não escrever suas derivações pisciano-pessimistas.

O chefe teima, alegando que o dasletra é plural, atento às tendências e que, portanto, deve abrir para todas as manifestações sem censura e deixar para os leitores a escolha do que e porque ler. Baboseiras...

Eu, de peixes, sou da cabeça para frente, não como aqueles outros que ficam abaixo de cabeça para trás. Nasceu, nada. E nada aqui – pelo amor de Deus – não tem nada a ver com Sartres e Nietzsches, do tipo “A vida mais doce é não pensar em nada”.

Nada aqui é só e somente só do verbo nadar, bater guelras, ir para frente. Abrir-se à imensidão do oceano, na infinita busca do desconhecido. Não como os outros, esses peixes que andam de fasta, procurando origens.

Nasceu, nada, seus merda!

Vêm por ai esplendores e azuis, podem crer. Tempos em que, uma vez padronizadas nossas características mais usuais e frequentes, vamos poder ter acesso a pílulas orais daquelas que mais convenham à ocasião.

Novas profissões advirão como a do personal stylist que saberá “tudinho” qual drágea tomar para frequentar determinado tipo de grupo social. Sem neuras e nem pleuras, assim clean.

Sem efeitos colaterais, claro.

É só ver que de alguma forma já estamos nessa, com nossos grupos watszapianos, faces, e tantos outros. Gozo puro, sem ônus nem beira e nem eira. Rola livre de um tudo, para satisfação geral da galera.

Quer tempo mais gozoso?

Tempos atrás não tínhamos essa liberdade, era crise existencial encima de crise essencial. Nauseantes abordares filosóficos ocupados com pormenores seres. Brolhos espermeantes!

Hoje e mais daqui a pouco só alegria. Alienação total, galera, e com muita ostentação porque não precisa ser pouca. Foco só no que interessa de tem-a-ver, nada de derivações cabeça, sem drama, nostalgias, essas perdas de tempo.

A ideia é dar às costas a tudo. E viver adiante com sorrisos de plenos dentes. E para sacanear com o meu colega de redação dos últimos posts termino com Nietzsche: 

“Perdido seja para nós aquele dia em que não se dançou nem uma vez! E falsa seja para nós toda a verdade que não tenha sido acompanhada por uma risada!”

Kkkkkk....



Até breve.

domingo, 17 de maio de 2015

GADGET



“Eu me pergunto pelo tipo de reconhecimento que dispensamos aos alienados, os errantes, os que perderam suas almas e estão em um mundo que não lhes parece mais deles e que são ‘forçados’ a sofrer de um lado do pacto, para ter lugar no mundo dividido entre vítimas e objetos intrusivos. Por outro lado não houve mudança substancial na história, para o bem ou para o mal, que não tenha se produzido em uma conjunção entre as narrativas de sofrimento semelhante à que estamos vivendo agora.” Christian Ingo Lenz Dunker (*)

Os dois comentários editados no post anterior são ilustrativos à agonia.

As circunstâncias, talvez, imponham mesmo e justifiquem o egocentrismo. Traduzindo em miúdos: a vida já é dura demais para eu cuidar do que é meu, imagine se fosse cuidar ao meu derredor.

Nos anos sessenta diante de impossibilidades criamos pérolas culturais que até hoje nos marcam:

“Você vem me agarra, alguém vem me solta
Você vai na marra, ela um dia volta

E se a força é tua ela um dia é nossa
Olha o muro, olha a ponte, olhe o dia de ontem chegando
Que medo você tem de nós, olha aí

Você corta um verso, eu escrevo outro
Você me prende vivo, eu escapo morto.”

Parece que ficou há cinquenta anos a nossa esperança perdida, quando madrugadas adentro tramávamos a revolução da qual adviria um admirável mundo novo. “Quando entrar setembro e a boa nova andar nos campos...”

Ocorre que, parece, tudo é muito maior do que pode nossa vã filosofia. A questão que nos assola não é nem política, nem econômica, nem social. A crise profunda de mudança de era não se trata de uma questão do Homem, mas da Humanidade.

Nosso declínio é mais fundo do que a opção por um modelo de gestão das riquezas extraídas pelos homens passando pela exploração de poucos sobre bilhões. É mais crítico do que aquele que chamamos capitalismo.

Nosso declínio se dá pela constatação acachapante de quão somos cruéis com nossos semelhantes e da nossa incapacidade, para além da Ética ou da Moral, de nos refazermos enquanto espécie.

Há algo que nos suplanta e nos impõe.

Não nos cabe mais pensar o Homem, mas ir à essência do que é o verdadeiro Humano. A complexidade de lidarmos com mais de sete bilhões de seres (no sentido mais essencial do Ser) não é matéria para disciplinas ortodoxas já conhecidas.

Evoluímos muitas vezes mais nos meios de operar a Vida do que dar significados à ela.

Reduzimos o viver a uma questão operacional, como se fôssemos mesmo assujeitados à nossa própria escravidão.

Não Somos, portanto.

E isto nos torna incapazes de dar o salto. Nem nós, nem deuses (inúmeros) que criamos à nossa imagem e semelhança podem nos dar respostas ao Humano demasiado Humano.

Melhor esperar que venha a nossa única certeza. Quem sabe depois dela é que haja mesmo juízo. 

Como no dito dos Homens: a esperança está depois de nossa morte.




Até breve.

(*)Entrevista à Manuel da Costa Pinto - O Condomínio Brasil - Revista Cult, Ano 18, abril de 2015

quinta-feira, 14 de maio de 2015

AGONIA



No retorno para BH ontem, à noite, assisti na TV de bordo do avião uma entrevista do ator Ney Latorraca ao Lázaro Ramos no programa Espelho produção do Canal Brasil.
Ney sofreu uma intercorrência grave quando fazia uma cirurgia de retirada da vesícula que o colocou por meses em situação deplorável. “Morri.” Ele disse. “Pesava 78 quilos antes da cirurgia e cheguei a 40 na fase mais aguda.”
“Quando comecei a me reabilitar não acreditava ser possível mais andar, jamais atuar, minha vida acabara. À partir daí e até hoje, em cada momento, tenho procurado viver cada segundo como se fosse o último dando o maior valor às coisas mais simples. Como me levantar de manhã, poder escovar os dentes, tomar banho, ler um livro. A morte passou a dar sentido à minha vida.”
Fui direto do aeroporto para o cinema assistir O Sal da Terra (o filme sairia de cartaz ontem no Belas Artes), de Win Wenders a partir da obra fotográfica de Sebastião Salgado.
Hoje procurei ler críticas ao filme e encontrei apenas algumas e fazendo referência à obra do fotógrafo, que é magnifica. Mas espere, o que Win Wenders nos mostra ultrapassa e em muito uma narrativa plana sobre o autor das fotos, ainda que o roteiro contemple uma biografia.
Win Wenders nos dá um soco na boca do estômago.
Somos a raça mais cruel do planeta.
Enquanto assistia ao filme pensava, à lágrimas contidas, na letra singela de Beto Guedes da canção homônima ao filme.
Anda!
Quero te dizer nenhum segredo
Falo nesse chão, da nossa casa
Vem que tá na hora de arrumar...
Tempo!
Quero viver mais duzentos anos
Quero não ferir meu semelhante
Nem por isso quero me ferir
Vamos precisar de todo mundo
Prá banir do mundo a opressão
Para construir a vida nova
Vamos precisar de muito amor
A felicidade mora ao lado
E quem não é tolo pode ver...
A paz na Terra, amor
O pé na terra
A paz na Terra, amor
O sal da...
Terra!
És o mais bonito dos planetas
Tão te maltratando por dinheiro
Tu que és a nave nossa irmã
Canta!
Leva tua vida em harmonia
E nos alimenta com seus frutos
Tu que és do homem, a maçã...
Vamos precisar de todo mundo
Um mais um é sempre mais que dois
Prá melhor juntar as nossas forças
É só repartir melhor o pão
Recriar o paraíso agora
Para merecer quem vem depois...
Deixa nascer, o amor
Deixa fluir, o amor
Deixa crescer, o amor
Deixa viver, o amor
O sal da Terra.
É impossível não se abalar com aquilo retratado na Etiópia, em Mali, em Serra Pelada e principalmente em Ruanda e na Bósnia, um "inferno na terra” conflitos mais hediondos da história recente da humanidade.
Deixei o cinema ontem à noite com um gosto amargo na garganta.
A miséria mais do que revolta, nos humilha a todos e a cada um em particular.
Morri.


Até breve.

terça-feira, 12 de maio de 2015

OITOCENTOSEUM



OITOCENTOSEMQUATRO calou-me por mais de oitenta horas. Com tantos nada cingiu. Tudo segue. Em casos, até de pior (pessimismo pisciano).

Roxos em pele, dolores. Corações perdidos em abalos por saudades e rompimentos. Maus feitos. Perdas em moedas de todos os centavos. Tramas, traumas, trotes, trumans...

Escrever deveria de ser de proibido. Especialmente em tempos de agora. Sem nuances. Assim, a grosso. 

Fiquei sabendo ontem que Europas resolvem a miséria de despossuídos e fugidios de guerras, trastes humanos, que zingravam mediterrâneos, asardinhados. Europas vão destruir embarcações de esperança dos malditos. Pobres dos novos bárbaros, vendedores de bolsas de grife em Venezians.

Do lado de cá lavagem, para porcos.

Eu, no meu pequeno, ainda peno com meus trens noturnos e internos. Pensei até em demitir meu redator de crítica política, colocaria a culpa em crise, redução de custos, como em tantos jornais, até nos mais tradicionais.

O contista, tornaria mortal, portanto, finituaria. Há dois filmes ainda no bojo do crítico de cinema: Feio (indiano) e Bastardos (francês). Dois obrigatórios. Tenho que vê-los de novo, para diluições.

E o humor, fica para os acontecimentos. Amigo de Vlad que está grávido de primeiro rebento perguntado qual gostaria fosse o sexo do bebê, vociferou: - "Qualquer um, desde que nasça e morra com o mesmo sexo!" Fino!

Tempos para gente de estômago e cérebros vazios de estupores.

Adorei, contudo, meu dia das mães que foi na coxia do Bê. 

Tim, afinal, com os bracinhos céus-me-guardem, andou quilômetros abaixo do pé de jaboticaba. De muito só tomou um tombo, que eu contasse. Antônio, que temo de por apelido, um lorde com seus veludos fádantes. Seu cabelinho penteadinho e aquele ar de "estou entendo tudo" . Chorar só se for aos gritos de acordar gatos em cestas.

Noninha, a primeira, me arrasa.

Meus filhos, genro, nora e, Ela.

Viver vai ficando cada vez mais miudinho e imenso. Me dá um vontade danada de guardar.

Aí aconteceu acaso. Este post já estava tingido até o final no ônibus do Conexão Aeroporto, quando, no vôo azul para São Paulo, em me deparo com Pitty, deliciosa no Canal Bis da TV à bordo.

Entrevista e cancha de algumas canções descobri um novo. Em umas das canções ela diz: "Eu estava sempre por aqui o tempo todo, só você não viu." "Nunca escrevi uma canção quando estava feliz. A felicidade é leve. Compor é um sofrimento, como uma autoanálise. Meus demônios viram música."

Tem composições como: "Eu vou te transformar em uma canção para poder gravar em mim." Ou em outra: "Sou mais que os seus olhos podem ver."

Foi Pitty quem disse: Eu gosto quando vem a fagulha."

Vou comprar todos os CD dela.

Depois entrou Cazuza: "Carreira, dinheiro, canudo." Tirando do cotidiano, para alguns: carreira profissional, grana e diploma universitário e, para ele (talvez, tendo querido dizer) carreirinha, pó e canudo para inalar. Eram tempos de picos.

Ah, a poesia: "jogado aos teus pés... Exagerado!"


Até breve.





sexta-feira, 8 de maio de 2015

OITOCENTOSEMQUATRO



Há quatro anos atrás a rede recebeu mais um de Peixes.

Sonhadores, emotivos, muito receptivos, indecisos, sensuais, os piscianos podem ser considerados os mais maleáveis em todo o zodíaco, com todas as características, positivas ou negativas, que esta particularidade possa conferir.

Possuem personalidade sensível e impressionável, podendo chegar à instabilidade emocional.

São facilmente afetados por pessoas ou ambientes. Por esse motivo, têm facilidade para sentir o problema dos outros, "como se fosse seu", e às vezes, tendem a anular-se ou submeter-se a uma vontade mais firme que a sua.

Por outro lado, são muito inspirados, intuitivos e humanitários, sempre dando mostras de um profundo amor às pessoas.

Sua personalidade é bastante complexa, e ao mesmo tempo em que se abre para a vida, se fecha em seu mundo, evitando encarar a dura realidade cotidiana.

A generosidade e a justiça são suas grandes marcas.

Ligam-se com frequência a atividades místicas ou religiosas, interessam-se por cinema, música, artes em geral e, não raro, exercem atividades em instituições filantrópicas.

Uma qualidade: Bondade.

Um defeito: Pessimismo.

A rede, esse universo de escolhas, desde 08 de maio de 2011, convive a cada quarenta e três horas e vinte e três minutos (em média) com um rebento de minhas inquietações mais profundas, de meus afetos mais generosos, minhas indignações, esperanças, tolices, pré e conceitos, idiossincrasias, manias, trejeitos, nuances, fobias, genialidade, ignoranças, expectativas...

Minha vida melhorou muito depois que decidi sair do armário, abrir minhas gavetas, sair-me para fora, deixar rolar de mim tudo, escancarada e deliberadamente. Pudesse, a cada hora eu me viraria um post. Descensuradamente.

Decidi chutar literalmente o balde, o pau-da-barraca, fazendo sessenta anos a dez anos de me tornar inimputável, não tendo que provar mais nada a ninguém nem a mim mesmo, querendo só amar só amar só amar meus netos, o meu futuro, a minha vida.

Sem um pingo de seriedade, repleto de profundidade por opção ao humor, jamais à ironia mórbida, simples, sem compromissos com nenhuma ortodoxia gramatical, estilística, de gênero, assim do jeito que pulsa e esgota nas pontas que dedilham todas as letras, disformemente às vezes na construção de palavras outras.

Sem holofotes, nem prêmios, nem patrocinadores. Sem crítica, pouquíssimos comentários, apenas pelo prazer de falar-se, sob um olhar a tudo.

Escrevi em todos os lugares por onde andei e em todas as horas. Banheiros de bares públicos e privados, ônibus de turismo, aviões, quartos de hotéis, restaurantes, durante reuniões de trabalho e em intervalos destas, em saguões de espera em aeroportos, freneticamente sempre em uma dimensão de forma que fosse suficiente para dar conta da ideia que fluía. Em minhas casas, em casas de outros.

Pela manhã, à tarde, à noite e pelas madrugadas.

Postei.




Até breve.

quinta-feira, 7 de maio de 2015

SUSTENTABILIDADE



Aliás, falando de saudade e de hipocrisia, esta não exclusiva do ex-diretor da Retrobrás (a empresa caiu de uma das dez maiores do mundo para a 429ª posição no ranking da Revista Forbes, tendo reduzido o seu valor à metade em um único ano), mas estendendo até aos mais altos escalões de Repúsblica, temos que falar também da nossa.

O Clóvis de Barros Filho, quem com corro no terreno das ideias, lançou (junto com Júlio Pompeu) o livro Somos todos canalhas – Filosofia para uma sociedade em busca de valores (Ed. Casa da Palavra) no qual ele provoca o leitor a fazer uma autoanálise nessa sociedade em que imperam o egoísmo e a incapacidade de se colocar no lugar do outro.

“Sempre alguém poderá pretender – com consciência disso – fazer prevalecer o próprio interesse particular em detrimento da convivência, em detrimento do outro. Pode ser no trânsito, no estacionamento do shopping, no banheiro da rodoviária, nas mais diversas situações. A pessoa não consegue transcender o próprio umbigo, o próprio prazer”, explica Clóvis.

Eu perguntaria: A pessoa, Clóvis? Que pessoa?

Por outro lado, o psicanalista Jorge Forbes coloca: “Vivemos um período em que as pessoas se sentem muito perdidas, a sociedade está `desbussolada´. Frente à angústia atual, todo mundo quer um chefe na vida que dita o padrão do bom gosto. Nessa época em que se perdeu o que é certo e o que é errado, as pessoas têm angústia de exercer essa liberdade. Como tudo pode, é possível errar mais. E isso as aflige. Ao expressar o desejo mais livremente, elas se angustiam, porque têm o poder da escolha.

Nesse momento de desbussulamento, ter um chefe que diga o que é certo e qual é o errado me acalma frente às minhas escolhas e aos meus desejos, em relação a tudo na vida.”

A Rádio Guarani 96,5 – A rádio que tocava o bom gosto (leia o post OBSOLESER (*)), foi leiloada e quem assumiu a frequência foi uma instituição religiosa. Ouvi essa semana a pregação de um Pastor que me fez tremer com a capacidade extraordinária de alguns em captar o inconsciente coletivo. Ele disse em sua pegação: “Não se importe com isso, meu irmão, até o Cristo por um momento se viu sem o seu pastor e voltou para a casa do Senhor”.

Pois é, Jorge, para alguns a sociedade está mesmo é “deusbussolada”. Ajam panelaços e dízimos.

Por sua vez, Noninha, dia desses voltou eufórica da escolinha cantando uma canção que provavelmente acabara de aprender. A mãe orgulhosa pediu que ela cantasse de novo a música.

- Não mãe, o gato comeu a minha língua!

Morro de saudade da época que eu era ovo e não tinha ainda me tornado galinha, portanto, canalha. (Para desentender, leia o post anterior).

Publico aqui, o penúltimo post antes de completar o 800° que espero trazer amanhã (data em que comemorarei quatro anos de edição), a foto de minhas mais caras esperanças e que passará a partir de hoje ilustrar o blog.



Até breve.

(*) Quis escrever assim para provocar mais o sufixo, só fixando-o.