terça-feira, 31 de janeiro de 2017

OMO



Brunhilde Pomsel, secretária do ministro de propaganda do nazismo, Joseph Goebbels, morreu na noite de sexta-feira, em sua casa em Munique, aos 106 anos. 

Quem divulgou a notícia foi Roland Schrotthofer, diretor de A German Life (Uma vida alemã, em tradução livre), documentário feito a partir de dezenas de horas de entrevistas realizadas com Brunhilde quando ela tinha 103 anos.

“Tudo o que é bonito também está infectado”, disse ela no filme, sem encarar a câmera. “E o que é horrível também tem seu lado brilhante. Nada é preto e branco, sempre há um pouco de cinza em tudo.”

Pois é.

Vai com ela arquivo de um tempo de trevas. O Belo é a ausência absoluta do infecto. O Belo são todos os matizes além da conjugação de todos, em harmonia. O cinza, inclusive, já que natural.

O feio vem do desnatural, da besta, da ignominia. Das entranhas do caráter de homens doentes sociais. Tudo que a Humanidade conseguiu produzir de pior pode ser encontrado em Goebbels. Seu ato mais covarde foi suicidar-se junto com sua esposa não sem antes de matar os seus seis filhos menores.

Não há nada de brilhante na perversão, antes pelo contrário.

Em dimensão menor, claro, mas de mesma natureza, observamos personagens da cena brasileira recente. Centenas de sujeitos que se locupletaram como homens públicos e solaparam poupanças sociais de estados da federação inteiros. Minas Gerais, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul estão dramaticamente quebrados.

Fizeram um vultoso e tenebroso ataque aos cofres do Estado trazendo o país a uma desordem sem precedentes e perspectiva de um futuro de dificuldades consideráveis.

Corta para o imediato.

Catapultado pelos governos petistas para ser o executivo campeão da atividade econômica, Eike Batista, dono da holding EBX, chegou a controlar 14 empresas nos ramos de mineração, indústria naval, tecnologia e eventos. O Grupo EBX concorria com outras gigantes do setor como Petrobrás, Vale e Odebrecht.

Em abril de 2012, Dilma participou da cerimônia da primeira carga de petróleo produzida pela OGX, e disse que Eike era um "exemplo a ser seguido, nosso padrão, nossa expectativa e orgulho do Brasil". 

No dia 7 de março de 2012, o empresário sobe para 7ª posição da lista de bilionários da revista 'Forbes', com fortuna avaliada em US$ 30 bilhões. Em 2011, Eike ocupava a 8ª posição no ranking.

No entanto, a história de decadência relâmpago de Eike Batista foi ilustrada na capa da revista Bloomberg Businessweek de 3 de outubro de 2013. O texto classifica a trajetória de Batista como um dos "maiores colapsos financeiros da história".

Ocorre que este sujeito não é a principal vítima de seus devaneios, sandices e vilanias.

Ocorre que não havia nada de brilhante neste sujeito. Ocorre que não há nada de Belo na trajetória deste sujeito.

Ocorre que vê-lo preso junto com tantos outros que ainda o serão é, afinal, resgatar de vez a esperança de um país passado a limpo.



Até breve.

domingo, 29 de janeiro de 2017

GASES



Pretinha pegou alguns livrinhos na biblioteca para Liz e Valentin. Entre eles, um destinado à Liz: Até as princesas soltam pum.

- “Sua cara, pai!” Mandou mensagem via WhatsApp, anexando foto da capa do livrinho.

- “Por que você não escreve suas histórias como a do livrinho. Ia fazer o maior sucesso! Genial”!

Pois é.

E o pior, capaz de ela ter razão. Sem particularizar no pum das princesas, a idiotia tem largo espectro de consumo. O que circula na rede e em todos os meios são toneladas de puns.

Youtubers são visualizados por milhões de pessoas centenas de vezes e expandem suas conexões virulentamente. Humor, ironia e idiotia têm limites tênues. Acho que esses ingredientes fazem parte do contemporâneo.

Rir ainda é o melhor remédio.

Especialmente como antídoto a tantas variáveis da realidade insustentável.

Sexta-feira agora brincava com Antônio e ele soltou um pum. Simulei susto e caí no chão. Antônio deu gargalhadas de perder o fôlego. Quis repetir a brincadeira e fez mais força do que seria necessária apenas para fazer o que princesas fazem.

- “Vovô, fiz cocô”! Disse ele, com as mãos nos fundos da cuequinha, um pouco constrangido. Ele está deixando suas fraldas e de quando em vez isto ocorre.

Faz parte da nossa formação e desenvolvimento.

Tudo bem que, durante a campanha, se possa exalar puns de diferentes megatons e alguns até encontrem narizes para serem absorvidos. São odores inerentes ao processo cada vez mais descivilizado da ilusória democracia do decadente Império.

Só que enquanto puns, vá lá. O problema é quando na sequência da buzina veem sólidos. Barrar a entrada de refugiados, de habitantes de determinados países supostamente envenenados com o mal muçulmano, construir fronteiras reais com o país de quem surrupiou uma metade do território em guerra, e outras borradas mais não faz ninguém rir.

Trump me assusta pelo nexo de suas decisões. Sua nervosa caneta baixa aos quilos decretos que criam imponderáveis consequências no curto, médio e longo prazo. A Justiça Americana vai entrar na disenteria e pode ocorrer o inverso do que sempre ocorre.

O Império copie a Colônia. Lá como cá se estabeleça uma crise entre poderes. Só que lá a Constituição tem mais de duzentos anos e, o pior, é letra viva.

E, como se não bastassem puns e sólidos subsequentes lançados para fora de seus vasos jurisdicionais, agora a coisa começa a feder internamente.

Punzão de ontem determinou às forças que elaborassem plano de extermínio de grupos terroristas com cronograma e custos de implementação.

Em dezenas de posts aqui citei pesquisa realizada por consórcio de universidades americanas e europeias, realizada em 165 países, sobre o que mais aterroriza as pessoas. Conclusão da pesquisa: Primeiro, a potencialidade de uma hecatombe nuclear. Segunda, a irreversibilidade da fome. Terceira, a ausência de líderes.

A mim o que mais aterroriza está em terceiro lugar. Príncipes que soltam puns. 



Até breve.

terça-feira, 24 de janeiro de 2017

ENREDO



Só por necessidade e por nenhuma outra razão.

Nada de deleite, ou glamurosidade, ou sufriento dos piores, permitam que eu erre no escrito. Não suporto folhas em branco, cursores frenéticos piscando na veia.

Do lado de cá, andei hoje por livraria e li orelhas e contracapas. Queria ser um daqueles, desde sempre. O que sobrou foi este espaço, menor, de qualquer um que queira.

Livraria são dormitórios, onde adormecem os personagens, até que leitores os resgatem à vida. Quando entro em uma sou tomado por estranha sensação de pertença. Fico querendo ser parte de uma daquelas estórias contada, personagem adormecido ávido por ser resgatado por leitor.

É como aqui.

Do lado daí, não sei. Só me chegam números e lugares de onde foram acessados os posts. Agora mesmo estava vendo a estatística e, nas últimas horas, 92 leitores na França vieram ao encontro de mim.

Só que não há a especificação de qual post leu, e nem se foi uma única pessoa que leu 92 posts, ou mais de uma vez vários posts, enfim quem veio ao encontro de mim. Ou mesmo, nem estava a procura de mim, a procura de outra coisa que post tivesse sugerido.

Corro um risco tremendo, escrevendo.

Vai que qualquer hora dessas alguém me resgata deste sonho profundo que durmo nas nuvens. Uma pessoa que me queira não personagem, mas sujeito, autor. E peça que eu fale sobre um post qualquer.

“Me fale porque você escreveu TÁCULO”, por exemplo. E eu me exaltarei se não for compreendido que o personagem já fez o seu papel, na verdade tela, mas já entregou o seu dizer.

E a pessoa caberá insistir, pois ficou muito interessada em saber do meu método de elaboração. Eu insisto: “Mas eu sou personagem!”.

Claro está que a escrita não se faz no post, mas em quem o lê. E quem lê constrói para si personagem que lhe couber, ora pois. Não venha procurar saber de mim o que está post.

Pensar assim é só um jeito de colocar um pouco de delírio no ar. Quando eu não for mais, seguirei nas nuvens, suponho. Até que alguém, que saiba, me delete. Supondo ainda que eu permaneça, por dez anos, adormecido nas nuvens e, de repente, alguém me resgate.

Não serei um personagem de mim?

Viver, portanto, é uma página, uma tela, um post. Deus deve estar irado para comigo. Vai que eu desfiz a ideia de que Há. Tudo não passa de um roteiro breve, assim de um texto inconcluso, etérnico.

Sou personagem, nada mais que um personagem à procura de si autor.

Pobre daquele que não se escreve.



Até breve.

segunda-feira, 23 de janeiro de 2017

ÁRVORE




Também se acaba vivendo tempo de invertimentos. Deveria no de certo era os mais adiante legar pros mais de perto. Só que não foi assim que se deu. Pelo menos, no caso.

No dia que eles foram embora para Lages, Liz trouxe prá mim um volume. Claro que avistei que dentro tinha um livro. Ela foi breve: “Procê, vovô.” E foi assim e pronto. Só que já lá ia indo para encontrar com a mãe que juntava os trem para pegar a coisa que voa e se voltou. “Abre, vô.”

Quando abri me deparei: Caderno de Poesias - Maria Bethânia. Liz tomou o livro de minhas mãos e abriu na página onde, ela e Valentin, tinham feito desenhos. Pretinha, dedicatória.






“Canto o crepúsculo da tarde
E o clarão da linda aurora
Canto aquilo que me alegra
E aquilo que me apavora”
(Patativa do Assaré)

“A vida chega a doer, a enjoar, a cortar, a roçar, a ranger,
A dar vontade dar gritos, de dar pulos, de ficar no chão, de sair
Para fora de todas as casas, de todas as lógicas e de todas as sacadas,
E ir ser selvagem (para a morte) entre árvores e esquecimento”
Álvaro de Campos (Fernando Pessoa).

“Ilumina a mina escura e funda
O trem da minha vida”
Renato Teixeira

“O corpo a corpo com a vida se odeia no índio
O que se odeia no índio é a permanência da infância”
Reynaldo Jardim

“Quem desconfia, fica sábio.”
Guimarães Rosa

“Vontade de beijar os olhos de minha pátria
De niná-la, de passar-lhe a mão pelos cabelos...
Vinicius de Moraes


E foi aí que ieu tomei o livro todo de um gole só e mirando no DVD.



Até breve.


domingo, 22 de janeiro de 2017

CANSEIRA



Pretinha levou de volta para Lages, na quarta-feira (18), Liz e Valentin. Antes passou por Floripa onde fica até hoje junto com Cláudio para aproveitarem praia.

Não pude leva-la ao aeroporto. Viajei quarta e quinta-feira a trabalho, o que me incomodou um pouco. Voltei da viagem mudo com uma forte inflamação na garganta. Na sexta-feira de 10:00h às 13:00h participei, com dificuldade, de reunião com cliente.

À tardinha vim pra Santa Luzia. Dei carona para tia d’Ela até a sua casa. Marlene estava um pouco aflita com o que estava acontecendo naquele dia. Com a posse de Trump ela teme que um de seus filhos, que vive há muitos anos na América, possa encontrar dificuldades de permanência e trabalho.

-“Já estou me vendo com os meus dois filhos cinquentões e família morando comigo no meu apartamento.” Disse Marlene referindo-se também ao outro (mora em BH), engenheiro dono de uma pequena empresa de projetos, que há vários meses não é demandada.

Na sexta-feira à noite liguei para Vladimir perguntando se viria no sábado com Fabiana trazendo Antônio e Helena. “Não pai, a gente quer que você descanse de netos.”

Sem netos, vou me cansar com que então?

Assisti o discurso de posse de Trump: “A América primeiro. Negros, mulatos e brancos têm sangue vermelho de patriotas. Americano compra produtos fabricados por americanos. Americano emprega americanos.” Síntese aterrorizante.

Trump parece anunciar que a ordem mundial que nasceu após 1945 e criou uma harmonia estreita entre as duas margens do Atlântico poderá sucumbir a seus repetidos ataques.

O isolacionismo para começar. Desde 1945, republicanos e democratas seguem a mesma linha: Europa e EUA estão engajados num único caminho e edificando uma “ordem liberal”. Trump parece decidido a reformular o mapa geopolítico mundial. Ele acredita que a Rússia tem o “direito de controle”, quase de “proteção” sobre a antiga Europa soviética (Ucrânia e países bálticos), além de achar que a Otan está obsoleta e ameaça se desligar dela.

“América em primeiro lugar” é o slogan que, para os europeus, significa que a Europa ficará entregue a si mesma, abandonada. Devolver à América sua grandeza exigirá poupar a nação dos exaustivos encargos que ela assumiu após 1945. E esse é o temor da Europa: que os EUA a deixem sozinha. E o pior, em estado de fragmentação.

Uma segunda brecha no edifício construído após 1945: o protecionismo. Após a guerra, todos os presidentes defenderam o dogma, quase sagrado, do livre-comércio. Trump poderá se desligar dessa estrutura que atualmente é a OMC.

Outro instrumento da longa cumplicidade entre americanos e europeus desde 1945: a União Europeia. Trump não aprecia essa UE “que está a serviço da Alemanha”. Além disso, não está preocupado se a Europa está unida ou não. E ele gosta dos que não gostam da Europa.

O divórcio do sistema mundial que nasceu após 1945, a indiferença em relação à Europa, a rejeição do livre-comércio, sua cortesia com relação à Rússia, tudo isso é tão radical que as pessoas se perguntam se são apenas provocações que se corrigirão quando Trump cair na realidade.

Mas então examinamos os colaboradores escolhidos por Trump, um bando de bilionários, reacionários e exaltados. Tudo indica que a ordem mundial que reina desde 1945 corre até o risco de ser desfeita nos próximos meses. Surge, então, uma outra questão: é verdade que essa ordem parece hoje ineficiente. Mas a nova ordem em gestação será mais justa, mais harmoniosa, mais generosa que a antiga?

Finalzinho da tarde do sábado marejei os meus olhos por outras razões: assisti Maria Bethânia, no Canal Brasil. Bethânia interpreta as canções com sua habitual entrega, saboreando os versos.

Carta de Amor, produção do Canal Brasil em parceria com a Biscoito Fino, seu disco mais recente – Oásis de Bethânia, de 2012 – serviu de base para a escolha do repertório. Comparecem: Chico Buarque, Paulo César Pinheiro, Gonzaguinha, Caetano Veloso, Arnaldo Antunes, Alceu Valença. 

As lágrimas são por força de uma pergunta: “Meu Deus, o que será o mundo sem esses?”.

À noite, depois de passar pelos noticiários, assisti no Cult A Conexão Francesa.

La French refere-se ao nome da rede de tráfico com base em Marselha, metrópole portuária do Mediterrâneo, que abasteceu os Estados Unidos com toneladas de heroína no começo dos anos 1970, elevando exponencialmente a criminalidade em cidades como Nova York, seu principal destino.

Nascido em Marselha, o diretor Cédric Jimenez cresceu ouvindo histórias dos tempos em que sua cidade foi o que seria na década seguinte a Medellín de Pablo Escobar, traficante que fez os EUA mergulharem em cocaína: uma terra de ninguém dominada por mafiosos que ordenavam assassinatos de desafetos nas ruas à luz do dia e controlavam tanto a economia local quanto a polícia e a justiça.

Dramática coincidência ou programação mais do que intencional, o filme baseado em fatos reais, portanto, narra a trajetória de um Juiz da Divisão Contra o Crime Organizado que é assassinado pela máfia.

Em seguida, sem sono, ainda assisti Até que a casa caia.

Apesar de separados, Rodrigo e Ciça continuam a viver sob o mesmo teto, um minúsculo apartamento de três quartos em Brasília, por razões financeiras.

O arranjo pouco usual coloca o casal em situações de conflito e faz Mateus, filho adolescente do casal, alimentar a esperança de que os pais reatem.

Rodrigo é professor de um curso de alfabetização de adultos, mantido por uma ajuda do governo que corre risco de corte. Para salvá-lo, ele pede ajuda a um deputado.

Figura ridícula, dá aulas com um nariz de palhaço e aceita, depois de breve relutância, participar de uma rede de maracutaias envolvendo o tal deputado e um grupo de empresários.

Ciça também é marcada pelo escracho. É mostrada como uma mulher fútil, mística de pacotilha que trabalha em casa fazendo consultas astrológicas para clientes tolos.

O delicado equilíbrio familiar é abalado com a irrupção de um quarto personagem: Leila, a secretária do deputado, que Rodrigo começa a namorar e que vai praticamente morar no apartamento dele.

Pois é.

A sequência alucinante de fatos devastadores que devastam da cena o imediatamente anterior. As cabeças cortadas nos pátios de presídios, a queda do avião com o Ministro, a posse de Trump. Até que a casa caia.

No meio disso tudo: Marilda Castanha, minha vizinha, esposa de Nelson Cruz ambos papa-prêmios nacionais de literatura e ilustração publicou no FB notícia vinda diretamente da Coréia do Sul. Pelo belíssimo trabalho do livro "Sem Fim", no qual homem e arvore "conversam" por imagens, Marilda acabou de ser anunciada vencedora na categoria "Purple Island" do Nami Concours. 

Acho que agora vou seguir a proposta de Marilda no Sem fim. Vou lá prá baixo conversar com minhas árvores.

Semana que vem, me canso com meus netos.



Até breve.

segunda-feira, 9 de janeiro de 2017

ILUSTRANDO



Para ilustrar os três últimos posts:

“Trinta anos de orgia consumista resultaram em um estado de emergência sem fim”.

“A preocupação com a administração da vida parece distanciar o ser humano da reflexão moral”.

“Três décadas de orgia consumista resultaram em uma sensação de urgência sem fim”.

“O fim desta confiança engendra, por outro lado, um ambiente em que ‘ninguém assume o controle’, em que os assuntos do estado e seus sujeitos estão em queda livre, e prever com alguma certeza que caminho seguir, sem falar em controlar o curso dos acontecimentos, transcende a capacidade humana individual e coletiva”.

“Loucos são apenas os significados não compartilhados. A loucura não é loucura quando compartilhada”.

“Viver entre uma multidão de valores, normas e estilos de vida em competição, sem uma garantia firme e confiável de estarmos certos é perigoso e cobra um alto preço psicológico”.

“O que pensávamos ser o futuro está em débito conosco. Para superar a crise, temos de ‘voltar ao passado’, a um modo de vida imprudentemente abandonado”.

“Uma advertência: ‘crise de democracia’ é uma abreviação, uma noção limitada. Em países com constituições democráticas, a crise de um Estado-Nação territorialmente confinado é culpa (afirmação fácil, mas não muito competente) de seus órgãos e características definidos constitucionalmente, com a divisão de poderes, liberdade de expressão, equilíbrio de poderes, direitos das minorias, para citar alguns”.

“A meu ver, os otimistas acreditam que este mundo é o melhor possível, ao passo que os pessimistas suspeitam que os otimistas possam estar certos... ”

“Se Marx e Engels escrevessem o Manifesto Comunista hoje, teriam de substituir a célebre frase inicial – 'Um espectro ronda a Europa – o espectro do comunismo' – pela seguinte: 'Um espectro ronda o planeta – o espectro da indignação'”.

“O comunismo se encaixava nas medidas do século 19. O século 19 foi um período de grande otimismo. Em primeiro lugar, as pessoas estavam convencidas — e tinham orgulho disso — de que, com o desenvolvimento da ciência e da tecnologia, seria possível refazer o mundo, virá-lo de cabeça para baixo”.

Pois é...

Frases de Zygmunt Bauman, para nossa reflexão. Eles nos deixou, hoje, aos 91 anos.



Até breve.

sábado, 7 de janeiro de 2017

TOLINVEJA



Duas características marcantes determinam o meu patrimônio virtuoso: a tolice e a inveja. Derivada da primeira advém a presunção intelectual destilada em textos como os dois últimos posts publicados aqui no dasletra.

Vou ao extremo presunçoso quando vocifero a morte das artes e da cultura denunciando que não há nada de novo sendo produzido que possa iluminar nossas angústias de propósito.

Como se não bastasse reafirmo aqui a sensação de viver, em tempos correntes, uma profunda treva, uma Idade Média estéril clamando por um novo Iluminismo.

Só mesmo a inveja para dar conta da minha cegueira em não reconhecer o extraordinário papel de pensadores públicos que diuturnamente e em diferentes canais de manifestação abrilhantam e enriquecem o pensamento.

Cito quatro luminares: Leandro Karnal, com quem dividi recentemente um encontro sobre Liderança Sustentável em São Paulo; Mário Sérgio Cortela; Luis Paulo Pondé e Clóvis de Barros Filho.

Minha tolice misturada com minha inveja não me permite destilar o estrondoso sucesso dos três primeiros magnânimos intelectuais em evento aberto ocorrido em Campinas no início do último outubro.

Karnal, Cortela e Pondé dão um show para uma plateia eufórica de quase cinco mil pessoas. Próximo de terminar o evento, o organizador (suponho) informa, que naquele momento, ocorria o pico de audiência do dia no You Tube com mais de trinta mil acessos.

Ontem, quando assisti ao vídeo CAFÉ FILOSÓFICO, o número passava de 350 mil visualizações. Tem cancha para atingir um milhão de acessos, além dos fragmentos editados para ilustrar ou provocar debates em diferentes mídias sociais, encontros acadêmicos, workshops corporativos e os cambaus.

Só um tolo carcomido pela inveja, que não teve seu blog chegado nem longe, em cinco anos de edição, do número de visualizações de um único dia daqueles caras, não reconhece que a cultura transborda.

Só mesmo um idiota que sofre sozinho com suas masturbações delirantes, não acredito eitar que milhões de brasileiros estão acesos e ávidos pelo sabor do saber e da verdade que transforma.

Ponto.

Basta ler os jornais, nos seus inúmeros artigos e comentários decorrentes, os noticiários da TV inclusive em canais abertos 24 horas por dia com analistas esclarecidos que propõem debates profundos e transformadores.

Ou nas redes sociais em que amigos virtuais trocam figurinhas coloridas em diferentes matizes temáticos patrocinando um intenso e extenso debate profícuo que inunda a comunidade de prazer e elevado compromisso intelectual.

Só mesmo um solitário desconhecido, descerebre, um escriba qualquerzinho desecoado, sem nenhuma contribuição objetiva colocada para não se rejubilar com as inúmeras adesões revolucionárias que estão em curso pelo país e apaziguar seu espírito com as alvissareiras possibilidades de um mundo virtuoso que se descortina.

Só mesmo alguém que nunca editou um livro sequer, nem Posts em Prática, coletânea de seus posts, e que jamais figurará na lista dos mais lidos na categoria de Autoajuda e Esoterismo.

E olhe que meu horóscopo de hoje sugere: “Dificilmente agir se orientando pelo que for necessário fazer é uma atitude que atrai a simpatia de todos. As pessoas preferem o que é adequado, o que não destoa, o que não provoca polêmica. O resto elas rejeitam”.



Até breve.

quinta-feira, 5 de janeiro de 2017

CONSUMO



Vejamos as coisas em pratos limpos. Urge fazê-lo. Com profundidade, equilíbrio e coragem. Repensar o cardápio, ir a ingredientes que determinem nova saudabilidade, retirar outros que só nos trouxeram males intestinais, estomacais e estéticos.

Há, e por décadas, em que pese o rol infinito de novidades, uma receita cada vez mais indigesta que, se não revista, nos levará a óbito.

A expansão dos meios, todos eles, com refinado uso de tecnologias cada vez mais agudas e sofisticadas, veem correndo os fins. Vide o exemplo basilar da telefonia móvel, misto de maravilha degustativa aos borbotões de usos com imensa contaminação venenosa de multilateralidade.

Com a telefonia móvel um prato não nos será mais servido. O do mistério. A disponibilidade permanente das portas abertas durante 24 horas ininterruptas, em multicanais de escolhas, sem censura e limites obesam o cérebro.

Onde não há mistério, não há o Humano. Ao longo de toda a História a ignorância, o medo, o gosto por saber ou por elaborar, sempre foram ingredientes imperiosos à natureza da mesa.

Perdemos a ignorância e com ela a inocência. Tudo está disponível para ser deglutido em pílulas breves, de fácil digestão e esteticamente sedutoras. As mídias eletrônicas, os bancos, as lojas de comércio, as seitas, os canais de encontros para todas as finalidades, tudo ao alcance de nossos garfos e facas.

Labuzem-se é a chamada.

Sobre o signo da velocidade de um clic a mesa, com serviço giratório, nos oferenda pratos requentados. A novidade não traz o novo, embora travestida de contornos. Do que se nutre é do mesmo.

As boates pegam fogo, casas de sociabilidades são atacadas por exércitos de um único transloucado que dizima dezenas; solitários suicidas explodem mercados, praças públicas, locais de eventos. O terror está incluso e já é hoje, menu internacional.

Nada nos escandaliza e nem nos acomete. O tempero já não diz mais de um sabor que nos sirva, de fato, a novas experiências nutritivas. O que se lava, não se limpa. Nem em séculos ocorrerá assepsia. Nem mesmo indo às ruas, com revoluções armadas, ingredientes do gênero. Esse câncer não tem cura.

No micro, crimes (não mais hediondos) se repetem sobre toalhas ensanguentadas. O último divulgado, levou esposa, filho, parentes, amigos e a si mesmo. Um psicopata, exalaram todos os canais.

A psicopatia não está nele, apenas. A psicopatia está na cozinha, em tantos que formulam receitas que implicam nessas não mais indigestas consequências. Quem será o próximo ou a próxima a incendiar, picotar, balear, esfaquear, seviciar um próximo ou uma próxima à mesa.

De todos os pratos servidos há um que mais me angustia e que, talvez, fosse aquele que poderia nos ressaudar. O da cultura e, por decorrência, seguido o prato das artes.

Em todos os cardápios disponíveis o que se serve não nos nutre e, pior, não nos trará higidez e saúde. Antes pelo contrário, são perversos, desprovidos de propósitos, contaminados às vísceras e sem o menor sabor.

Sem cultura e arte, morte ao mistério.

Fecha-se o ciclo alimentar.



Até breve.