sexta-feira, 14 de setembro de 2012

CORES



Ontem, pela primeira vez, resolvi escrever o post do dia no meu Ipad que ganhei de presente no dia dos pais. Logo que iniciei lembrei-me de minha máquina de escrever alemã que pesava pouco menos que um fusca amarelo, também de origem alemã.

Escrevi nessa máquina sete livros. Além de escrevê-los à mão, datilografei, montei e encardenei todos os volumes. Fiz inclusive as capas. Tenho todos ainda, guardados no quartinho da garage do prédio onde moro. Ali guardo bugigangas, tralhas e outros inservíveis. Meus livros dividem espaço em prateleiras onde estão também exemplares de jornais de cidades mundo-a-fora editados nos dias em que as visitei.

O processo de montagem dos livros constituía no seguinte.

Após terminar de escrever todo o livro eu preparava as folhas de papel subtraídas de empresas onde em trabalhava na época de elaboração do texto. Somados todos os volumes eu estimo em duas mil a duas mil e quinhentas folhas de papel ofício. Jamais vou me esquecer dos meus empregadores que financiaram, sem saber, minhas obras hoje ainda inéditas.

Dessas duas a duas mil e quinhentas folhas de papel ofício eu fiz o dobro de páginas datilografadas. Só um dos romances, DOR, conta com quase quinhentas páginas. IINFECTUM tem quase trezentas. ÍMPAR inacabado tem outras trezentas.

Eu dividia cada folha em duas, media a margem inferior e fazia a lápis um pequeno risco para que eu pudesse saber a hora de parar a datilografia. Ali, naquela marca, eu sabia que eu estava na última linha de cada página. Meus conhecimentos operacionais sempre foram e serão rudimentares.

No futuro, quando forem queimar estes entulhos intelectuais medíocres, por favor, considerem o cuidado que teve aquele jovem datilógrafo em medir e marcar o limite da margem inferior para última linha, página por página.

As capas foram elaboradas artesanalmente. A do livro DOR foi feita com um cartaz de propaganda de cerveja que eu peguei em um bar. O verso do cartaz era absolutamente branco e brilhante.
Medi e cortei no tamanho pouco maior que as páginas do livro e dobrei o cartaz de tal forma que o seu verso ficasse a minha disposição na sua brancura para se tornar capa. Com um pequeno frasco de cola preta para trabalhos infantis escrevi a palavra título e deixei que escorresse das letras um certo excesso, como se delas sangrasse. Depois peguei outro frasco de cola, esta vermelha, e cobri todo o resto da capa. Em seguida, usando a haste de pressão da tampa de uma caneta Bic, fiz várias ranhuras ao longo de toda a capa, misturando parte da cor preta das letras que escorriam.

Depois que aquela maçaroca secou, plastificando a capa, gostei tanto do resultado que percebi que eu, aos dezessete anos de idade, além de não ter o menor talento para a escrita se fosse viver das artes plásticas eu estaria fadado às esmolas. A capa sugeria carne esquartejada dando o sentido que eu queria explicitar DOR.

Está tudo lá no quartinho de minhas ruminescências.

Não ultrapassei a primeira palavra no Ipad. Meu celular tocou. Era W, um amigo, dizendo que, em dez minutos, passaria para me pegar em casa para irmos para o aeroporto. Viemos ontem, à noite, para Arraial d’Ajuda.

Agora cedo recolhi as folhas de papel onde escrevi este post durante a viagem e as transcrevi para o meu laptop. No fundo tenho uma puta saudade de minha vida aos dezessete, quando eu construía minhas ilusões a bordo de um fusca amarelo, alemão de origem.


Até breve. 

2 comentários:

  1. Existe algum projeto real de publicação de um livro. Você já tem um acervo desde os 17 anos e mais 168 posts do blog. Podemos esperar um livro ou pelo menos um e-book?

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    1. Julinho, na verdade são 268 posts. No momento não há nenhum projeto de publicação. Não ficaria bem prá mim, nessas alturas, subtrair folhas de papel de ofício das empresas para as quais presto consultoria e nem tenho frequentado bares para surrupiar cartazes de propagandas de cervejas. Portanto, por enquanto, fico apenas com posts. Salve Leozinho!!!

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