terça-feira, 7 de maio de 2013

Ó



Em AQUIDENTRO leitor anônimo me brinda com um comentário: “Crescemos no que está fora do nosso controle. Imagina se tudo fosse organizado, não haveria desafios e só assim nossa capacidade é exigida, não é mesmo”?

Há um portão de acesso de pessoas acoplado ao de uma das garagens para automóveis no prédio de apartamento em que moro. Quando a pé prefiro passar por ele, já que está no nível da rua e me poupa de passar pela portaria com escadas. O acesso é mais rápido. O dispositivo que faz com que a fechadura se abra desse portão é elétrico e, quando acionado, produz um barulho forte.

Até algum tempo atrás, quando saía para passear com Noninha e passava por lá, acionava o interruptor para abrir o portão. Ela, com olhares em outras descobertas, se assustava com o barulho produzido pela fechadura. Hoje sempre que passo com ela antes aviso: “Noninha, ó o barulho!” Ela move sua mãozinha direita em direção ao ouvido e pisca intermitentemente seus olhinhos de jabuticaba.

Na época da ditadura os militantes da contra-revolução picharam pelas ruas das principais cidades do país uma frase: “Tá tudo certo, mas tá esquisito”. É dessa época também um dos momentos de melhor planejamento que o país experimentou, os PNDs - PLANO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO, elaborado por ministros como Reis Veloso, Mário Henrique Simonsen, Delfin Neto e outros. Todos orientados a um país muito certo, mas que estava esquisito.

Hoje vivemos em um país cujas instituições democráticas são referência para outros, uma constituição ímpar, um acervo de leis algumas ainda que anacrônicas, mas que no conjunto são mais do que suficientes para garantir o Estado de Direito. Temos um sistema de apuração eleitoral, talvez o mais seguro, rápido e confiável do mundo. Um sistema de pluripartidarismo que se por um lado embola por outro sinaliza o desejo de envolvimento.

Estamos organizados.

Nosso desafio não reside na nossa capacidade de nos tornarmos um país. Temos de sobra. Nossa questão, sabemos até pelas nossas piadas: “Vocês vão ver que povinho que eu vou colocar aí”, frase atribuída ao Criador.

Portanto, me parece, que a nossa tragédia histórica fundante é de nosso caráter, incapaz de levar verdadeiramente a sério a tarefa de nos tornarmos responsáveis por aquilo que nos cabe e que é indelegável: o compromisso com a cidadania.

Claro que evoluímos e muito, mais na microfísica do poder com nossos gestos no cotidiano do que quando ocupamos posições de relevância e alcance de transformação social. Lembro-me de uma conversa a sós que tive com uma candidata a cargo político de expressão em Brasília, há alguns anos atrás. Dez minutos transcorridos de seu depoimento sobre o que significa uma candidatura a governador, senti náuseas profundas que me levaram incontinente ao banheiro. E olhem que eu sempre soube, ou pelo menos, imaginava saber.

Leitor amigo, está tudo organizado sim com muita gente boa produzindo choques de gestão que têm melhorado a máquina. Temos, como em outra época, até um PAC – PLANO DE ACELERAÇÃO DO CRESCIMENTO.

Nossa questão, como no passado, ainda são os subterrâneos. “Tá tudo certo, mas tá esquisito”.

Este blog limita-se a: “ó o barulho!”. Eu sei que é pouco.


Até breve.

2 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Não é pouco não.

    Tem uma frase que eu gosto, mas não sei de quem é, que retrata o muito do seu blog:

    "Nossos pensamentos geram nossos atos e nossos atos geram pensamentos nos outros."

    Abs.

    Lindinho

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