sexta-feira, 17 de junho de 2011

CARREIRA V

Retornando do Mato Grosso tratei imediatamente de procurar ‘nova colocação’. Comprava diariamente o jornal para ver se nos pequenos anúncios do caderno de empregos traziam algo em que eu pudesse me aplicar. Interessei-me por um de Auxiliar de Escritório em uma empresa de produtos químicos com sede em São Paulo, embora logo que terminei de ler o anúncio tenha ficado preocupado. Era no mesmo prédio do contrabandista de jóias e relógios. Teria ele mudado de ramo? Quanto pesa a mala de produtos químicos? Meu patrão seria polonês? Pensei em telefonar para o meu tio e perguntá-lo se meu antigo patrão estava precisando de secretário. Limpei minhas fantasias e fui para o centro da cidade.
Tomei o elevador do prédio do endereço do anúncio. Quando a porta se abriu no andar do escritório vi um grande grupo de jovens em fila nos corredores. Fiquei parado dentro do elevador, o ascensorista fechou a porta e seguiu deixando passageiros até o último andar. ‘Você não vai descer?’ perguntou-me. Eu respondi: ‘Fico no térreo. ’
Já na rua, eu estava retornando para casa, quando: ‘Caramba, eu não posso desistir assim. Eu tenho que tentar, apesar de já ter muito candidato na minha frente. ’Resolvi voltar. No elevador o ascensorista resmungou alguma coisa como: ‘Aqui não é lugar para passear... ’ Deve ter ficado surpreso quando eu desci no andar solicitado.
Fui para o último lugar da fila. A fila andava lentamente. Uma única pessoa fazia as entrevistas. Toda vez que o elevador parava no andar desciam dois, três outros candidatos. Pensei em ir embora. Minhas chances diminuíam a cada vez que o elevador parava no andar. Ocorreu-me então uma idéia ousada.
Pedi uma caneta emprestada a um dos candidatos que seguia à minha frente, peguei um maço vazio de cigarros que estava jogado num cesto colocado no piso do corredor, e estiquei a folha de papel a ponto de ele servir à um bilhete que redigi. Fui até a secretária da pessoa que estava fazendo as entrevistas e pedi a ela que entregasse o bilhete ao entrevistador. Minhas pernas tremiam e quando a jovem me perguntou se eu era candidato à vaga disse que sim e: ‘por favor, querida, é muito importante que você faça isto por mim’. A jovem relutou um pouco, mas depois entrou e fechou a porta onde ocorriam as entrevistas.
Voltei para o meu lugar na fila, embora os rapazes que estavam atrás de mim queriam que eu fosse para o último lugar. Para minha surpresa, de repente apareceu a secretária no corredor como procurando por alguém: era eu quem ela estava procurando. Ela veio até a mim e disse: ‘volte às cinco horas. ’ Desci como um bólido as escadarias dos onze andares do edifício experimentando um misto de satisfação e dúvida. O que significava: volte às cinco horas?
Cheguei às 16h30min no edifício e tomei o elevador às 16h45min para o 11º andar. Quando o elevador passou pelo 5º andar disse ao ascensorista que eu havia me enganado e que eu ficaria mesmo era no 10º andar. Desci no 10º andar e fui até as escadas, minha intenção era verificar se ainda havia fila e se parte dos candidatos da parte da manhã ainda estavam lá. Temia tomar uma surra.
Não havia ninguém no corredor e nem na ante-sala do escritório onde estava tranqüila a jovem secretária. ‘Ah, é você... Aguarde um minuto que eu vou anunciá-lo ao Eder. ’ Disse-me a jovem com um sorriso nos lábios. Quando entrei na sala deparei-me com um sujeito de olhos verdes imensos, de camisa e gravata, boa pinta e super agradável. ‘Então você é o esperto do bilhete?’, disse dando tapas nos meus ombros. ‘Sente-se ai, disse apontando para uma poltrona em frente a sua mesa repleta de papéis. ‘Por que você escreveu o bilhete? Perguntou colocando as pernas sobre a mesa e inclinando-se na sua poltrona giratória. ‘Por que eu sou a pessoa que o senhor está precisando. ’ Respondi convicto. ‘E por que você acha que é você quem eu estou precisando?’ Perguntou acendendo um cigarro. ‘Porque eu estou precisando mais do emprego do que o senhor de mim, então vou fazer tudo para acertar. ’ Eder deu uma gargalhada, tirou os pés de cima da mesa, levantou-se da cadeira, veio ao meu encontro, pegou a minha mão direita e me puxou dando um forte abraço. ‘Zé Lopes, o emprego é seu! Pode começar amanhã?
Grande Eder Gagliardi, dois anos mais tarde eu já havia me demitido do escritório, ele veio a ser meu padrinho de casamento. Grande pessoa e líder. Aprendi muito com ele. No meu casamento ele me disse que iria guardar o meu bilhete de lembrança por toda a sua vida.
No bilhete eu havia escrito: NÃO ADMITA NINGUÉM ANTES DE ME CONHECER.
No próximo post relato um dos anos mais significativos da minha vida.

Até breve.

Um comentário: