domingo, 20 de janeiro de 2019

NADA






Ouço o grito da página com suas entranhas em brancas linhas.

Ela me convida:

- “Preencha-me, e me faça encontrar sentido”...

Como se o sentido de Tudo estivesse em linhas tortas e vagas, permeando conscientes fugidios, matreiros, escolados e/ou tenebrosos inconscientes inconfessáveis ou essencialmente marcados por infinito e definitivo mistério.

Ai de mim, página literalmente em branco porvir!

De que tintas e cores me restarão letras e sobre que construções de vínculos entre elas - ainda que poéticos - palavras em frases marcarão genuínos olhares?

Há muito me perdi em turbilhões. Sexta-feira, ouvi de uma amiga que eu perdi o veio.

Pode ter sido, ou entrei por outro onde cabe silêncio, resguardo, cansado de parir filhos impróprios.

Ninguém que turva páginas deveria se encontrar, perder-se sempre deverá ser o melhor caminho.

A escrita é o maior crime cometido pelo homem contra si mesmo. Sem ela não cometeríamos tantos desatinos, nem cartas de amor ou ódio, nem contratos avessos, tratados torpes, leis, sentenças, juízos.

Ah, os livros! Ah, a Literatura! Instrumentos perversos, repletos de viagens alucinógenas, construções de olhares em perspectiva fantasmáticos e delirantes.

Deveríamos todos que escrevem nos autocondenarmos e sair de cena. Mesmo aqueles que deixam lenitivos, esperança, bonança, como se humanizar-se pela leitura fosse uma verdade inconteste.

Escrever é cometer crime hediondo, ler é cumplicidade mórbida.

Nenhuma entranha de nenhuma página é preenchida se não por horrores, dramas entre Eros e Tanatos (ou será Thanatos, com esse H de Humano), pulsões contumazes, erráticas e danosas.

Tudo isto por um vazio ou tristeza, não sei. Assisti à A Esposa, e à Monsieur & Madame Adelman. Ambos essa semana, o primeiro no cinema e o segundo na Sky.

Escrever é gerar procura. Quem quiser viajar, assista aos dois filmes e se perderá comigo.

Só assim terei feito mais uma vítima.


Até breve.

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