domingo, 8 de janeiro de 2012

A/OCASOS

Desembarcamos em Belo Horizonte na madrugada de sexta-feira. Embriagados ainda de alegria por quatorze dias inesquecíveis de viagem. No vôo apenas um incidente que acabou, felizmente, com um final feliz: na poltrona da fila de assentos ao lado e imediatamente atrás da nossa, embarcou uma senhora de oitenta e dois anos. Vinha de Cuba acompanhada pelo marido e por vários outros membros de sua família. Logo que o avião decolou observaram que ela estava paralisada e com os olhos arregalados. Várias pessoas gritaram por médicos a bordo. Surgiu um homenzarrão vestindo uma dessas camisas cheias de verdes, amarelos, azuis e tal de Porto Rico, apresentando-se como médico. Minutos depois a senhora, hipertensa, estava recuperada do mal súbito. Durante a viagem conversei com o marido dela que me falou do quanto eles haviam se encantado por Cuba, apesar de. Eu disse que também já havia estado em Cuba e quanto me impressionara a experiência.
No sábado, em Santa Luzia, fazíamos compras em um supermercado e encontramos com uma amiga. Comentava sobre nossa viagem e ela, viajante internacional assídua, disse: “Eu sou muito ruim de América Latina, praticamente não conheço nada. Na verdade, acho que não damos muito valor ao que é nosso.”
À noite, assistimos no Telecine Cult ao clássico O OVO DA SERPENTE, cinemão de 1977 produzido por Dino de Laurentiis, com a direção de Ingmar Bergman e protagonizado por Liv Ullmann e o impagável David Carradine. O filme é ambientado na época pré-Hitler e aponta as circunstâncias vividas então na Alemanha. Degradação ampla, ausência de perspectivas, desconfiança coletiva no futuro, depravação moral generalizada e, sobretudo, medo. Imenso medo. Abel Rosemberg (David Carradine) judeu, trapezista, tenta sobreviver após o suicídio do irmão, também trapezista com quem Abel fazia dupla em um circo. Filme não se conta, no máximo comenta-se ou recomenda-se. Para mim é importante registrar aqui que o ambiente é marcado fundamentalmente pelo medo.
Na sequência, talvez acordados pelo O Ovo da Serpente, assistimos ao programa de Serginho Groisman, na Globo, em cujos intervalos comerciais celebridades dizem o bordão: “o programa inteligente na madrugada”.  Os participantes foram: Boni, Pedro Bial, Caetano Veloso, Gal Costa, Cláudia Leite e depois, mais para o final do programa, a modelo Isabeli Fontana. Perguntas da platéia, constituída apenas por jovens, foram endereçadas aos convidados. Aponto aqui algumas respostas ou comentários:
·         Para Boni, a TV sofrerá sensíveis mudanças com o advento das redes sociais e estaremos livres da programação restrita e determinada pelas emissoras. Todo conteúdo estará disponível em diferentes modelagens no momento em que o interessado assim o quiser para fazer uso e deleite.
·         Para Bial, ex-correspondente internacional em conflitos armados, o BBB é um excelente programa.
·         Para Cláudia Leite, apoiada por Caetano, os artistas da Axé Music são atletas. Ela já ficou em cima de um trio elétrico por doze horas ininterruptas. A média é de seis horas e, para Caetano, eles tocam e cantam bem o tempo todo.
·         Para Isabeli Fontana, ela só não gosta do conceito de beleza no mundo atual da moda. Há muita anorexia.
Então, não há medo nas circunstâncias presentes, o que nos desobriga de um salvador, como no Ovo da Serpente. Ocorreu, no entanto, um momento particularmente interessante no programa a altas horas: um jovem de uns quinze ou dezesseis anos, o mais novo a se manifestar, fez com imensa dificuldade uma pergunta dirigida à Caetano: “Como você vê as músicas de hoje que só têm amorzinho, florzinha, queridinho e não há composições como aquelas da época da ditadura engajadas com propostas de transformação social?” Caetano respondeu que 90 a 95% das músicas em todos os tempos só tratam de florzinha, amorzinho, queridinha e que só o restante é “diferente”. Serginho Groisman interpelou o jovem que havia feito a pergunta dizendo que o rapaz não deveria ter saudade do que não viveu.
Fiquei pensando. Afinal o que é melhor para o advento do Humano: a presença ou a ausência de medo?
Caetano continua nos 5 ou 10%. Vem com seu filho Moreno e com Gal num projeto embalado por arranjos eletrônicos. Uma das faixas é Neguinho. Começa assim:
“Neguinho não lê, Neguinho não vê, não crê, pra quê
Neguinho quer saber.
O que afinal define a vida de neguinho?”
Acho que este post foi inspirado por inúmeras placas que observei em fachadas de lojas na Colômbia: MISCELANEAS.
Apenas.

Até breve.

2 comentários:

  1. Seja Bem vindo a " lagoa Belô "

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  2. O melhor do programa pra mim, foi qdo o Bial entre outras, disse: "assisto a muita coisa ruim na TV" e o Boni não deixou por menos : vc vê o BBB. kkkkkkkkkkkk. O riso e a expressão do Caetano, serão para mim inesquecivel. Bom demais.
    Grande abraço.

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