terça-feira, 10 de setembro de 2019

RUPTURA





“Nunca passaremos definitivamente da ignorância à certeza, pois o fio do questionamento sempre nos levará de volta à ignorância”.
Sarah Bakewell

“A necessidade de reflexão, de fazer sentido em nossa condição temporária, é a dádiva paradoxal que recebemos do tempo, e possivelmente o melhor consolo.”
Eva Hoffman



Assisti à Bacurau no cinema e, no CCBB, ao espetáculo mineiro “E Ainda assim Se levantar”.

Em cena da peça do CCBB um dos personagens coloca: “Perguntei a meu primo se ele contrataria um advogado ou um médico. Claro, ele me respondeu. E um ator? perguntei-lhe em seguida. Para que serve um ator?”.

Frequentemente coloco-me a pensar sobre o serviço da arte, a função, o lugar. Para além do entretenimento, à diversão, ao lazer, ao riso. A Arte como formadora de consciência, em sentido mais amplo que possa ser.

Ontem, à noite, experimentei emoções trazidas da memória. Na juventude, quando universitário da FAFICH da Rua Carangola fui assíduo frequentador e entusiasta participante dos diversos movimentos teatrais acobertados pelo DA.

Ontem, no CCBB, reexperimentei o sangue nas veias esquentarem pelo texto panfletário encenado. Um grito, literalmente, para que aquilo que estava sendo trazido fosse ouvido pela plateia. Instigação, sedução, apelo desesperado, clemência, todo o tipo de manifestação em benefício de uma escuta.

De onde podemos encontrar forças quando parece que não podemos aguentar mais? Essa é a questão proposta pelo espetáculo que encerrou sua temporada, mas que deve retornar ao palco, por força do sucesso de público.

O texto resultou de um projeto da pesquisa “a potência da precariedade”, que durante todo o processo de criação levantou questões que buscam identificar como podemos encontrar força em situações de eminente esgotamento, pessoal, social ou político.

Momentos assim são paradoxais. Como dizia o poeta Holderlin, onde mora o perigo, é lá que também cresce o que salva. Essa é uma das reflexões que motivaram a criação do espetáculo.

Bacurau explicita na telona, por outra vertente, a mesma questão. Até quando vamos suportar. O filme abre com o enunciado: daqui alguns anos.

Tanto filme quanto peça não podem ser sorvidos ao pé-da-letra ou a cada cena. Há muito de arte neles envolvida para horas e horas de reflexão profunda. Quem sabe até atitudes?


Eu quero me permitir um tempo para processar.

Ambas as obras servirão a mim para pensar. Embora tenha presente que, a cada dia, pensar seja algo que não sirva a muitos.


Até breve.




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